quinta-feira, 14 de julho de 2011

Império Terra - O Princípio

"Império Terra - O Princípio (Império Terra 1)", de Paulo Fonseca (Papiro Editora)

Sinopse:
(…)“Caminharam juntos até ao passeio. Laura deixava para trás a sua mota, com pesar. Aquela mota que acompanhara por tantas vezes, e que sentia como parte de si. Fosse como fosse, teria de a deixar para trás quando partissem. Talvez, devesse fazer o mesmo com aquela nova verdade, que a deixara frustrada.
Os seus pais nunca lhe haviam falado de vampiros. Os vampiros faziam parte do imaginário popular, das histórias de terror, do cinema. No fundo era como Gabriel dizia: uma verdade rejeitada pelos eruditos. E os seus pais não eram povo.
Como é que poderia imaginar um mundo maravilhoso com vampiros e lobisomens?!
Se os asquerosos não teriam lugar nesse novo mundo, aqueles também não o teriam. Seria necessário eliminá-los!
De repente a iluminação piscou. Os olhos de ambos fixaram-se no horizonte, até onde alcançavam, e começaram a ver a luzes extinguirem-se, umas atrás das outras, como peças de dominó, como se as trevas fossem tragando a luz num gloop-gloop dantesco; anúncios atrás de anúncios, cartazes electrónicos atrás de cartazes electrónicos, salas de escritórios atrás de salas de escritórios; e os candeeiros nas ruas...
Uma espécie de rastilho correu as ruas de Lisboa apagando tudo o que eram luzes.
Fez-se trevas.
Um piscar trémulo e insistente atraiu a atenção de Gabriel. Um dos candeeiros da Av. 5 de Outubro extinguia-se como uma brasa, para logo se reacender como se assoprado, até que desistiu. Lembrou-o, sarcasticamente, da esperança da humanidade...
As trevas desceram sobre Lisboa.” (…)

Opinião:
Há livros que começam amenos, se tornam muito quentes e depois, por alguma razão, arrefecem a dada altura. Este livro pode ser considerado um pouco assim, embora no fim recupere um pouco.

Começando com algo semelhante a um cliché do género, com o protagonista a sair de um coma que fez com que perdesse o início de mudança radical da vida no planeta, cedo a história ganha ânimo e em apenas algumas páginas o leitor está embrenhado no enredo e aliciado pelo mundo que o autor nos apresenta.
Com descrições muito boas do circundante, usando de locais que o comum leitor conhece pelo menos vagamente, mas introduzindo mudanças subtis -características de a obra acontecer alguns anos no futuro-, penso que a construção do cenário foi dos pontos mais fortes de todo o livro, tornando todo o envolvente realista.

Começando num cenário de ficção científica bem arquitectado, infelizmente a partir do meio as perguntas tornam-se muito mais numerosas que as respostas e o autor introduz tantos dados novos que a beleza inicial se perde, de certa forma, num rebuscado juntar de informações incoerentes e dispersas. Uma das coisas que me deixou mais insatisfeita foi o facto de praticamente não termos respostas nenhumas. Não sabemos quem são os inimigos, de onde vêm ou qual o seu propósito. E não é só em relação aos inimigos que nada sabemos, pois o autor toca em muitas coisas, sobre o passado do Gabriel, sobre os marcianos, sobre ... tudo, e no fim poucas são as resoluções que o leitor consegue obter e a informação chega a ser tão parca que é difícil fazer especulações.


Tal como referi em cima, até meio do livro, a narrativa era interessante e intensa, sem necessitar de acção para aumentar o interesse, mas depois do Nolen aparecer, a história começou a descambar. Primeiro os diálogos/monólogos iniciais do Nolen eram do mais cliché que pode existir. Depois temos o que se passou com a Romana e o Gabriel e que não fez sentido nenhum, não só pela experiência que o Gabriel já tinha com os vampiros, mas especialmente porque nessa altura a Petra varreu-se-lhe da mente como se nunca tivesse existido (e também a Laura). E, lamento dizê-lo, mas a partir desse momento todos os diálogos se tornaram banais. Foi como se a segunda metade do livro fosse apressada, recheada de cenas de acção sem resolução concreta,  apimentada com moralismos excessivos.
O final foi mais interessante do que contava, mas ainda assim deixou demasiadas perguntas por responder (e espero que sejam atendidas no volume seguinte).

Já que falo em moralismos, gostei do que o autor tentou criar em modos de fé na humanidade, mas a certa altura tornou-se demasiado. De tal forma que me cansei de ler o Gabriel a dizer que era céptico e a Laura que acreditava na humanidade. Isto foi tão repetido, que se tornou excessivo. Foi apenas um ponto acima do que deveria, mas esse 'um ponto' saturou. Menos um grau de moralismo seria mais apreciativo e não era preciso muito para chegar a esse equilíbrio.

Em termos de personagens, penso que tanto o Gabriel como a Laura foram bem expostos, embora nenhum deles seja particularmente 'heróico' ou o tipo de protagonista com o qual o leitor consiga criar afinidades (pelo menos eu não consegui). Agiam de acordo com as suas personalidades, e nisso o autor conseguiu trabalhar bem.
Já em relação às outras personagens, creio não poder dizer o mesmo. Nenhum se destaca, pois todos foram tocados apenas superficialmente.

Em termos de escrita, no geral foi cativante e dinâmica, fazendo com que o leitor vire as páginas rapidamente para continuar a história, mas há certas coisas a apontar, e que não posso deixar de referir. Começo pela mudança abrupta do ponto-de-vista. No início isto não acontecia, mas aos poucos o autor foi mudando a visão da personagem sem aviso e de forma aleatória, de forma a 'convir' à narrativa. Isto era de tal forma notório que nas batalhas o leitor nunca era apanhado de surpresa, porque saltávamos dos olhos de uma personagem para a seguinte. Isto não é um ponto a favor, pois o leitor necessita ser surpreendido.
Outro ponto a assinalar é o facto de a narrativa, por vezes, estar no presente, depois já estar no passado. Isto tornava a leitura algo confusa, mas felizmente isto só aconteceu até um certo ponto no livro, e depois muito esporadicamente.

Em suma. gostei do livro porque o achei engenhoso na criação e diferente nos protagonistas. Se fosse a avaliar o livro pela primeira metade, certamente lhe daria mais pontos, mas infelizmente a segunda metade estava demasiado aleatória, demasiado embrenhada em si mesma e atulhada de informação e moralismos, para que eu pudesse realmente dizer que era o que esperava. Irei ler a sequela, na esperança que resolva muito do que ficou por saldar. Espero também que os erros cometidos neste volume não se repitam no próximo e que a panóplia de personagens seja mais interessante.

Capa, Design e Edição:
A capa é muito simples e generalista. Nada diz sobre a história, apesar de ser bonita, simplesmente não tem nada de único nem simboliza particularmente nenhum pormenor narrativo.
O design interior está simples, masbem acomodado.
Já a edição não está primorosa, já que os erros que apontei em cima (em termos de PdV e tempos verbais) deveriam ser facilmente detectados com um editor.


P.S.: Este livro foi-me gentilmente cedido pelo autor, Paulo Fonseca, a quem agradeço a oferta.

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